O Que é Sofrimento
O que é sofrimento? A primeira resposta para isso seria outra pergunta: qual a filosofia? Basicamente, ao longo da história da filosofia, pensadores buscaram entender o problema do sofrimento atrelando esse problema ao mau, atrelando esse problema à violência ou atrelando esse problema à própria ideia de condição humana.
Uma das coisas em comum, em primeiro lugar, é o reconhecimento do sofrimento como parte da existência humana e sempre tentar encontrar caminhos para diminuir ou eliminar esse sofrimento.
O sofrimento do qual se ocupa a psicologia, basicamente, é a dor psíquica ligada à questão do desejo e da frustração do desejo. A dor psíquica é sempre um conflito entre desejos.
Cada filosofia vai ter a sua concepção de sofrimento e vai, justamente, a partir dessa concepção, mostrar como é que eu posso trabalhar a mim mesmo no meu cotidiano para vencer esse sofrimento.
Os históricos, por exemplo, lá ainda no período romano, entendiam que para diminuir o sofrimento eu preciso me liberar e me libertar das coisas.
Séneca, um filósofo romano, dizia que eu sou escravo daquilo que eu tenho medo de perder e, portanto, uma das maneiras de evitar o sofrimento era de antemão saber que eu vou perder, saber que a vida tem perdas, tem separações, tem interrupções e me preparar para isso.
O primeiro dos conflitos que todos nós enfrentamos com grande frequência, cotidianamente por alguns e com alguma angústia, outros menos, é a incompatibilidade de certos desejos.
O segundo tipo de conflito entre desejos é o conflito entre aquilo que eu sou e os meus ideais. Por exemplo, talvez eu seja uma pessoa tímida e talvez meu ideal seja ser uma pessoa incrivelmente carismática, extrovertida, um líder. São conflitos que eu estou tendo, por que eu, na verdade, quero uma coisa que eu não consigo.
O Que é Sofrimento
No século XIX, Arthur Schopenhauer, outro filósofo, agora alemão, vai entender que o sofrimento é uma parte inerente da vida humana, por que o sofrimento decorre da nossa vontade, e claro, de todas as frustrações decorrentes da impossibilidade dessa vontade de se manifestar livremente.
Em todos os casos, existem vários outros, a filosofia sempre vai mostrar que o sofrimento é uma parte da vida humana, mas que a partir de uma vida filosófica você consegue diminuir esse sofrimento, lidar com ele e mantê-lo próximo, por que tentar eliminá-lo talvez fosse uma ilusão. Mantê-lo próximo, mas compreendendo os porquês desse ato de sofrer é o melhor a se fazer.
O terceiro tipo de conflito psíquico e conflito de desejos, é o conflito entre aquilo que eu quero e aquilo que o ambiente quer de mim. Há uma expectativa permanente do outro com relação a mim, e eu com o outro, em que os nossos desejos são diferentes.
Então, esses três conflitos de desejo ocupam quase o tempo inteiro as angústias das pessoas nos consultórios, nas buscas de livros de auto ajuda, na busca na religião, etc. Não são os únicos problemas, mas são os principais.
Como Sair do Sofrimento?
A psicologia, na verdade, olha hoje de uma maneira ampla para esse fenômeno, dividindo isso em três grandes eixos.
Uma analogia que hoje em dia é fácil para as pessoas entenderem: com a computação, você pode imaginar que tem um primeiro eixo, que é aquilo que é constitutivo em você onde a sua essência e o seu temperamento é o seu hardware. Esse seu jeito de ser, a maneira como você nasceu, essa sua disposição natural, pode estar causando conflitos para você e sofrimento porque o mundo espera de você coisas que não correspondem ao seu hardware.
Uma segunda possibilidade, é olhar para o seu software, fazendo de novo aqui essa analogia computacional, porque nós não somos só nossos instintos, as nossas disposições genéticas e biológicas. Nós somos em grande parte, aquilo que nós aprendemos a ser.
Olhando ainda por esse modelo de hardware e software, você tem um terceiro fenômeno que é o ambiente no qual o programa vai rodar. Talvez a sua natureza, o seu radar e os apps que baixou sejam ótimos para rodar naquele programa, naquele ambiente.
Digamos que uma pessoa que é tímida e que tem todos os apps baixados de um evitativo tímido, discreto e recatado, nasceu no século XIX no Japão, que é uma sociedade do recato e que aceita que você se insira no coletivo e seja submisso, e inclusive é elogiado, essa pessoa vai estar muito bem.
Esse mesmo sujeito, nasceu na década de 80, época do Lobo de Wall Street, na época da bolsa de valores, de um mundo que exigia sucesso e competição, essa pessoa vai estar muito mal adaptada naquele mundo.
Então, essas três coisas conversam entre si!
Ao longo da história da filosofia, várias saídas foram propostas, quase todas elas em algum momento vão trabalhar com a ideia de que o sofrimento está vinculado a maneira como você recebe as questões externas que te fazem sofrer. Algumas delas vão mostrar que, embora eu não possa acabar com as coisas que me fazem sofrer, eu posso aprender a lidar com essas coisas e entender que o quanto eu vou sofrer por causa de alguma coisa, de uma pessoa ou de uma situação, depende muito do quanto eu quero sofrer, o quanto estou preparado para esse sofrimento.
O que faz a psicologia clínica para lidar com isso?
Ela trabalha nos ajustes do seu hardware, do seu software e dos ambientes, e aí você tem sempre as seguintes questões: em parte, você vai ter que se ajustar ao mundo e ir contra a sua natureza, mudar os seus valores, adquirir novas habilidades. Em parte, você não vai ter que se violentar e ir contra a sua natureza e contra aquilo que você aprendeu, mas você vai poder mudar o mundo no qual você está. Você escolhe outros ambientes. É um jogo que você tem que aprender a fazer.
Epicuro, um filósofo da Grécia Antiga, vai nos lembrar que o sofrimento decorre em muitos casos, do nosso apego às coisas, e que quando você deixa de lado essa busca de prazeres absolutamente efêmeros, mas vai tentar encontrar um prazer que seja mais contínuo, mais perene, eu elimino alguns aspectos do sofrimento.
Quais aspectos perenes? O amor naquilo que você não pode perder, por exemplo, o conhecimento!
Obviamente, não é possível evitar o sofrimento. Entretanto, se você dividir a população do ponto de vista do quanto as pessoas são inerentemente mais felizes ou infelizes, você vai ter uma curva de Gauss em forma de sino onde tem uma ponta pequenininha de pessoas muito azaradas que nascem com certas características biológicas que incorporam uma infelicidade inerente.
São pessoas que tem espectro bipolar, depressões endógenas. Então, a série de quadros que em grande parte ou são de nascença ou adquiridos biologicamente, as deixam permanentemente numa infelicidade, não importa o que aconteça na suas vidas.
Tem um outro grupo de sortudos que nascem com uma genética, ou são hipomaníacos permanentes ou são pessoas que simplesmente tem uma autoestima muito elevada, uma vitalidade excepcional e que são intrinsicamente mais felizes.
A maior parte da população está no centro dessa curva, mas são pessoas que vão estar mais felizes quando tem sorte, quando as coisas dão certo e, vão estar mais infelizes, quando as coisas dão errado.
Uma vida infinitamente feliz, seria talvez, uma vida infinitamente entediante por que não teria absolutamente nenhum desafio para ir além daquilo que já está acontecendo.
De certa maneira, o sofrimento é uma das coisas que nos afetam e, como todo bom afeto, nos move.
Como ao longo da vida nem sempre a gente tem tanta sorte, tanta fartura, a infelicidade se alterna com a felicidade e o que acontece é, que as pessoas ao longo da vida, os estudos mostram que entre 50, 55 e 60 anos, elas reportam um momento grande da sua felicidade. Prevalece mais um bem estar do que o mal estar, por que elas aprendem a lidar com essa sorte ou azar desenvolvendo uma certa sabedoria de vida.
Nessa arte de viver, esse prazer maior, ele vai sendo adquirido pela maioria das pessoas ao longo da vida ou vivendo simplesmente, ou, buscando ajuda: procuram religiões, procuram a filosofia, procuram livros de auto-ajuda, procuram psicólogos. Mas, a própria vida vai provendo a pessoa desses conhecimentos.
Para finalizar, não é possível ter uma vida de felicidade, mas é possível ter uma vida em que prevaleça um certo bem estar consigo mesmo. Isso é possível!
Uma felicidade infinita nos manteria mais ou menos na mesma situação, na mesma sintonia, quase que o tempo todo e nos causaria um tédio fenomenal e também geraria outro problema: até onde a gente sabe, não dá pra se manter um estado contínuo sem ficar cansado, por mais estranho que possa parecer.
Uma felicidade contínua, talvez fosse muito cansativa para nós. Daí, a ideia de uma felicidade infinita, paradoxalmente, poderia se converter numa infelicidade muito grande.
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